A transformação digital implica em um consumo maior de energia, e isso quer dizer maior oferta e uma melhor distribuição quando a eletrificação das frotas de veículos forem acelerando. E quem vai dominar esse mercado de distribuição de energia para esses veículos, por exemplo? A primeira aposta seria as distribuidoras de energia por sua capilaridade? Claro que não, afinal setores oligopolistas como os de energia, tem dificuldade para entender o novo, e quando entendem já é tarde. Então seriam os postos de combustível? Claro que não os distribuidores de derivados do petróleo não entenderam que é impossível lutar contra o inevitável, e por isso investem tão pouco em estruturas de carregamento, e com isso continuam espremendo seu velho negócio até a última gota, fazendo cara feia para os veículos elétricos, sem entender que o tempo de recarga pode gerar novos negócios com valor agregado ainda maior. E quem então?
Se eu fosse fazer uma aposta eu diria que o perfil da distribuição da energia para eletrificação da frota será totalmente diferente ao de combustíveis derivados do petróleo.
Todo movimento disruptivo cria um novo desenho, sem reproduzir o velho, afinal “o passado é uma roupa que não nos serve mais”.
O fornecimento de energia terá diversos atores, com um papel de destaque para as montadoras como BYD, TESLA e GWM, entre outras que estão priorizando os veículos eletrificados, essas montadoras estão lentamente percebendo que o inimigo de um elétrico são dois: Disponibilidade para recarga e tempo de recarga. E como se resolve isso ofertando carregadores em parceria com todo e qualquer tipo de operador que mantenha um carro parado por mais de 30 minutos, como shoppings centers, estacionamentos, supermercados, empresas de parquímetros de rua, tudo em que culturalmente esse mesmo consumidor já esteja acostumado a deixar seu carro.
No futuro a oferta da energia será tão grande que na maioria dos lugares ela será oferecida aos donos de automóveis como quem oferta Wifi grátis em um café. A energia gratuita não será um diferencial, mas sim um requisito.
E quem paga essa conta? Simples não existe almoço grátis, considerando que o ticket de um supermercado depois de uma hora de compras seja superior a R$900,00 reais e que um carro carregando 6,5Kw/h esse supermercado estaria pagando para o consumidor cerca de R$3,25 o que representa na média dos automóveis atuais que rodam uma carga suficiente para rodar aproximadamente 50 kms. Já pensou você para em um supermercado, faz suas compras e depois pega o seu carro com um aumento de 50 kms na autonomia?
Pois é exatamente isso que vai acontecer, e certamente os shoppings, supermercados e estacionamentos vão encontrar quem ache essa conta com eles, que em breve vai fazer parte dos custos de venda, tal qual tantos outros, ou por acaso alguém questiona a energia consumida pelos aparelhos de ar-condicionado nos supermercados e shoppings, ou alguém imagina hoje um estabelecimento sem ar-condicionado? Exatamente isso, essa rotina será incorporada e logo fará parte do cenário urbano, centenas de milhares de carregadores espalhados por todo lugar.
O outro ator na modificação desse cenário serão os autoprodutores, criando pequenas redes de abastecimento, e claro a multiplicação de painéis fotovoltaicos nos telhados, nas praças de estacionamento.
Bom lembrar que com a publicação da Resolução Normativa da ANEEL 482/12, permitindo que o consumidor brasileiro possa gerar sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada, podendo inclusive fornecer o excedente para a rede de distribuição de sua localidade, criou-se um potencial mercado de micro e pequenos geradores de energia, logo imagine esse segmento com a adoção dos veículos eletrificados, onde milhões de veículos no curto e médio prazo poderão ser abastecidos nas nossas garagens? Tente imaginar empresas com centrais de geração fotovoltaica e ou eólica em seus pátios abastecendo as suas frotas? São inovações que aliam economia financeira, consciência socioambiental e auto-sustentabilidade. A geração distribuída, além de reduzir o custo de abastecimento para milhões de pessoas, vai criar um redesenho completo em toda cadeia de logística no mercado de combustível, que deve ficar muito diferente, logo os milhares de caminhões transportando combustível em nossas estradas devem ter seu volume reduzido, os oleodutos que transportam combustível devem ter sua vazão reduzida, e o Direito Urbanístico vai caminhar para regulamentação que torne obrigatória postos de re-abastecimento desses veículos elétricos, sejam eles caminhões, motos, ou bicicletas, além é claro das frotas de carga comercial em toda moradia multifamiliar e comercial coletiva.
Dando números a esse potencial, apenas para você ter uma ideia do potencial da energia solar, basta acompanhar a última declaração do diretor de Sustentabilidade da Petrobras, Maurício Tolmasquim, afirmando que o Brasil possui capacidade para aumentar a energia solar em até 100 vezes. Para identificarmos a grandeza do que tratamos, atualmente a capacidade instalada nacional é de 30 gigawatts(GW), o que já é bastante representativo, logo tente imaginar a quantidade de energia disponível e espalhada por todo Brasil?
A ampliação diversificada dessa rede de distribuição, apresenta outros benefícios, como o adiamento de investimentos em expansão dos sistemas de transmissão e distribuição, o baixo impacto ambiental, a redução no carregamento das redes, com a minimização das perdas e a diversificação da matriz energética.
Ao mesmo tempo, com o objetivo de reduzir os custos e tempo para a conexão da microgeração e minigeração, bem como compatibilizar o Sistema de Compensação de Energia Elétrica com as condições gerais de fornecimento de energia, foi publicada a Resolução Normativa nº 1.000/2021 e a Resolução Normativa nº 687/2015, pela ANEEL que revisou a Resolução Normativa nº 482/2012, todas ampliando essa oportunidade que deve vir acompanhada de alterações em leis municipais.
Nas maiores cidades brasileiras a legislação já está tornando obrigatória a presença de carregadores, o que deve ser expandido para instalação de espera para futura instalação de carregador nas vagas de garagem sejam os edifícios residenciais ou comerciais.
Ao mesmo tempo, a legislação já caminha para um redesenho da recuperação com possibilidade de reciclagem dos lixos dessas mesmas edificações, que podem tanto ir para um lixo ou para uma usina de produção de energia movida a resíduos.
A Geração distribuída, é uma aliada da transformação digital, e não existe evolução sem um alinhamento regulatório, seja na produção de incentivos, pela renúncia fiscal, na incorporação de políticas tributárias estimulantes ou na obrigatoriedade do poder de polícia no regramento do direito de construir.